Até que a morte nos separe.
E ele beijou-a nos lábios. Primeiro suavemente, depois cheio de volúpia, gana, vontade mesmo. Ela ali, completamente entregue.
Aquilo era um sorriso? Sim, ele tinha certeza que era um sorriso.
Tinha pouco tempo mas não tinha pressa nenhuma. Queria namorar um pouco, sentir os cheiros daqueles cabelos sedosos que pareciam vindos diretos de uma propaganda de shampoo até suas mãos. Podia sentir a textura de cada fio, mesmo usando aquelas grossas luvas. Cabelo grande, liso, macio...
Se soubesse do encontro, teria tomado um banho, usado aquela colônia nova que comprou na revistinha da colega de faxina. Poria uma camisa mais da moda, sapatos. Sapatos sempre impressionam as mulheres, sei lá. Ela merecia.
Mas quase sempre estes encontros aconteciam assim, sem se esperar. Tudo em cima da hora.
Ele ainda com sua roupa de trabalho, aquele macacão horrendo, aquelas luvas amarelas pesadas, enquanto apenas um lençol cobria o corpo dela. Foi desembrulhando cuidadosamente, com os olhos gordos de criança que ganha um presente maior que esperava.
Sabia que se as coisas fossem diferentes poderia até ser correspondido como queria.
Talvez algumas pessoas estranhassem a diferença de idade, ele já carregava mais de trinta e cinco anos de frustrações, broncas e cabeça baixa. Até por isso, quem lhe conhecia ficava surpreso ao entender que ele não tinha os cinqüenta e poucos que usava em sua vida todos os dias.
Já ela não. Tinha o frescor e o olhar distante, daqueles que com vinte e poucos anos acham que o mundo é um umbigo. Bonita, aspecto saudável, rosto lindo e bem desenhado.
Não. Ele olhava para ela e via claramente que agora que os anos nunca seriam empecilho para os dois. Não daquele jeito. Não naquela madrugada. Nunca mais.
Se a realidade fosse outra e o acaso ajudasse, ele sabia que poderia conquistá-la realmente.
E a levaria ao cinema, ao parque, ao zoológico. Não. Zoológico fede. Ele já havia trabalhado em um e todo mundo suja tudo, cheiro de cocô de bicho para tudo quanto é canto. Não. Ela merecia mais.
Um restaurante bacana, um rodízio de pizza de vários sabores, quem sabe?
Tinha um ótimo na perto da casa dele. Ele pagaria.
Mas dava pra ver de cara que ela, com aquele ar de Patricinha, não era muito chegada a subúrbios. Tampouco era chegada a massas. A barriguinha durinha e bem dividida, dava sinais claros de muito tempo de malhação e cuidados.
O dinheiro traz isso.
A pele macia, de uma branquice imensa, guardava lá longe uma marquinha de biquíni de uma praia que com certeza ele não freqüentaria. No máximo para limpar. Rico suja tudo e nem liga para o filho da puta que está ali limpando. Só falta jogar lixo na gente.
Voltou a ela.
Os seios duros, rijos, de bicos rosas, apontavam para cima com a certeza da juventude. Ele passou a mão sobre eles e sentiu claramente que ficavam duros. Tinha certeza absoluta. Ali era tudo dele.
“São em momentos como estes que somos todos iguais, não é mesmo?” Diria o seu amigo vigia. “Ou cagando, ou morrendo, ou trepando... Todo mundo é igual.”
Disse o vigia certa vez enquanto jantavam suas quentinhas no salão maior.
O amigo tinha sorte de ser casado. Sempre trazia uma comida legal, uma carne assada, um frango ensopado, batata-frita. Ele adorava batata-frita. Na latinha dele sempre macarrão. Era o que ele sabia fazer, o que comia e o que sofria para colocar pra fora horas depois. Por que ele não podia ter batata frita na sua marmita? Ela não tem cara de quem vai pra cozinha!
Beijo-a de novo agora com raiva, posse e para provar que podia tudo, mordeu seu lábio.
- Poxa! Desculpe! machucou?
Ela nada disse. Ficou ali imóvel fitando o teto distante dele.
Aquilo o deixava doido. O sangue subiu a cabeça e ele pulou as preliminares. Tirou o macacão, cueca e ficou nu sobre ela. Vestia apenas as luvas, sua mania.
- Olha como você me deixa... – Adorava a sensação de tocar em si mesmo com aquela aspereza nas mãos.
A penetrou com força e sentiu o corpo sobre ele tremer com sua vontade. Começou a ir e vir e sentiu que ela balançava de um lado para o outro como se não tivesse vontade própria.
Aquilo o deixava doido. Não resistiu e lascou-lhe um tapa na cara. Ela não reagiu. Outro. Mais outro e sentiu o alivio vir da sua cabeça e sair pelas suas partes. Havia acabado. Com ele aquilo era sempre rápido. As namoradas reclamavam, a ex-esposa também. Por isso apanhavam, depois diziam que não entendiam o porquê. Lembrou de todas as outras e saiu de cima dela ainda com raiva.
- Vocês são tudo iguais... Ta pensando que é melhor que eu? – Enquanto colocava sua roupa, desfilou uma série de palavrões dos mais variados, com tal raiva que os perdigotos saiam como chuva. Nada parecia ofendê-la.
Aquilo o deixava doido, vontade de pegar a sua vassoura e...
- Que porra é essa Elias?! – O vigia entrou e sua postura voltou a de sempre. Cabisbaixo, sem encarar, pacato. Agarrou a vassoura que já segurava e colocou a sua frente como se pudesse se esconder por de trás dela.
- Nada não, nada demais... – Disse ele ainda arrumando a roupa.
- Você tava gritando feito louco... Já terminou?!
Ele balançou a cabeça afirmativamente. O vigia se aproximou dela examinando seu rosto. Ele cruzou o braço sobre o peito e enterrou a cabeça no próprio tronco, procurando no chão com o olhar um espaço entre seus próprios pés. O vigia arregalou os olhos.
- Caralho! Tu bateu nela?!
- Esbarrei... A pele tá sensível, eu acho... Vão pensar que foi do acidente...
- Já te pedi pra não bater nas peças... Se tu não se controlar isso ainda vai dar merda. Cadê meu dinheiro? – Fez um sinal de grana com os dedos e esticou a mão espalmada na direção dele. Ele tirou umas notas amassadas do bolso e entregou ao vigia.
- Me ajuda a arrumar o lençol... O legista chega as duas e a peça tem que estar arrumadinha!
Ele olhou o grande relógio da parede. Faltavam 15 minutos. Fizeram as coisas sem pressa. Cobriram o corpo, empurraram a maca até próximo as gavetas da geladeira e removeram-na para dentro de uma delas cuidadosamente. Ele fechou a gaveta lentamente como se despedisse. O vigia notou então que ele chorava contido.
Um choro cheio de soluços, catarro, dor, falando palavras baixinho pra ele mesmo como numa reza contrita. Vez por outra limpava o nariz com a blusa.
Toda vez ele tinha que consolá-lo.
- Relaxa cara. Em breve a gente vai ter carne nova no pedaço... – Falou enquanto dava-lhe tapinhas nas costas.
Aquilo sempre o confortava. No final, sempre tem.
45 comentários:
Carne nova no pedaço.
20 de fevereiro de 2009 às 19:46Pode ser bom ou ruim rsrsrsrrsr.
Muito boa a estrutura da crônica, a "Carne nova no pedaço", também chamou minha atenção, afinal, nunca sabemos o que esperar.
20 de fevereiro de 2009 às 19:52http://cisnema.blogspot.com/
Retribuindo a visita...
21 de fevereiro de 2009 às 16:07Uau! O final me surpreendeu, não esperava mesmo. Parabéns, bem legal.
Adorei a frase do Pessoa, diz tudo. E quanto a a Clarice, pra mim é quase "Cla". : )
Enfim, estou te favoritando lá pra ler mais vezes.
beijo beijo
achei bem contado esse filme que passou pela sua cabeça!
21 de fevereiro de 2009 às 18:36gostei muito do seu blog
21 de fevereiro de 2009 às 19:42parabens pelo post!
O final é super legaal =D não esperava.. hahaha
21 de fevereiro de 2009 às 20:06Vale a pena guardar um tempinho no diia pra ler coisas assim... e esses seus 'filmes' são inspirados em que? hauhaua =D
Ótimo blog ! Parabéns !
Beijo
Nossa, ando reparando que tem TANTO publicitário que eu encontro os blogs por ai.
21 de fevereiro de 2009 às 20:40Acho que vc é o 5º já !
Talvez seja mais um talento nato dos publicitários né? hahaha
espero que seja =D
Você é realmente muito observador ! E tem razão na questão do 'lembrar', até porque, como diz o ditado: 'nada se cria, tudo se transforma'.. hahaha xD
Beeijo :*
Muito bom seu conto, com um final que eu não esperava.
21 de fevereiro de 2009 às 22:01Tava desconfiado dela apanhar tanto e nao falar nada. Ou tava gostando muito, ou era inanimada...rs
22 de fevereiro de 2009 às 14:00A cronica é longa, mas é tão prazeroza e tão tem construida, que nem percebi.
Excelente final, e isso acontece mesmo na vida real.
Excelente blog. Vou conferir mais postagens. Ganhou mais um visitante...rs
Abçs!!!
http://blogpontotres.blogspot.com/
Adorei o conto. Você tem um senso de humor negro ou afro descendente, se preferir. rsrs Brincadeiras a parte, seu conto é excelente, fiquei com os olhos vidrados na tela quando fui descobrindo onde eles estavam. Você tem um ritmo de escrita muito bom e consegue criar personagens muito interessantes. Adorei, simplesmente foda!!! rs
22 de fevereiro de 2009 às 14:20QWqwgQYWqgwyQWYqgwygQYWQGywgQYWGqH
22 de fevereiro de 2009 às 18:47Me surpreendi no final..
amei teu texto..
detalhes..
ó detalhes..
mas você abusou deles..
achei que precisa diminuir mas tudo bem.
é teu jeito de escrever..
obrigado pela visita..
e quando tiver 'carne' nova no pedaço, me chama?
:)
pra vir em teu blog..
é claro..
abrçao !
que historia boa
23 de fevereiro de 2009 às 23:51obs: vc levou calote, mas pior do que calote são comentários sem profundidade, do tipo "li o título e disse que era legal o texto" isso sim é foda
24 de fevereiro de 2009 às 00:02pior que existe histórias assim por ai
24 de fevereiro de 2009 às 00:05homens com falta de confiança que se menosprezam tanto, não sentem confiança em si e acabam cometendo esse tipo de loucura!
como disse Freud, o sexo esta relacionado a tudo! E um cara pra chegar nesse nível de violência ou melhor, de loucura, é pq esta bem perturbado!
culpa da sociedade q sobrecarrega o homem com tanta pressão e cobrança!
bela história, final inusitado!
abraço!
Reeealmente acho que todo mundo se surpreendeu no final IAUHAIAHA . Bom obrigada pelo comentário e pela dica também . Beeijo
24 de fevereiro de 2009 às 21:27Em todas as cabeças passam filmes. Na minha, passam vários, mas na sua... humm! Vc é bem criativo, poderia pensar em fazer cinema! rs
25 de fevereiro de 2009 às 12:06Gostei do seu texto, do seu blog, a Carne Nova no pedaço foi uma grande sacada!
um abraço,
HUASHUAHSuas'
25 de fevereiro de 2009 às 12:24esse texto e os outros desse blog prende você do titulo a ultima frase...então não importa se ele tem 5 ou 50 linhas...eu realmente fiquei curiosa para saber o final
e como as outras pessoas que leram eu realmente não esperava o final,
parabéns pelo blog espero visitar mais vezes aqui...
xD
Parabéns pelo post e pelo blog!
25 de fevereiro de 2009 às 12:29Surpreendente cada fato narrado como de um escritor.
Um oferecimento do neófito mas distinto: chip-novo.blogspot.com
o que é isso?
25 de fevereiro de 2009 às 14:49um conto?
"E a levaria ao cinema, ao parque, ao zoológico. Não. Zoológico fede"
25 de fevereiro de 2009 às 15:01Meu ex poderia ter pensado nisso um dia... hehe...
Seu blog é incrível, não o conhecia.
Seu comentário foi o primeiro do meu novo Blog, O descompasso... mas ja sou blogueira de tempos no blogspot.
Gostaria que desse uma passadinha nele:
http://antigastucia.blogspot.com
Será uma honra.
Beijos.
qe essooo...
25 de fevereiro de 2009 às 15:25fez ela tremer então é estilo anaconda!
koaskoasokasoksakp!
bto bom o texto..
os de menor devem ta se exercitando essa hr!
kaosakoskoasokas
gosto do que tu diz. gosto do jeito que o personagem pensa e como ele é com a mulher. me dá certo calafrios. mas uma coisa é certa: transando, morrendo e cagando todo mundo é igual!
25 de fevereiro de 2009 às 17:35parabéns pelo blog também! acho que ainda não tinha retribuído a visita do meu! então aqui está! :)
beijao
puta que pariu. vc me gerou revertério paudurescente ate o outro pólo.
25 de fevereiro de 2009 às 17:42que horror!!!!!!! iuehiuehuiehiuehiuehiuehiueh mandou bem
Já achei estranho ele ter conseguido ficar com ela, mas ele ser um killer...hehe, não esperava mesmo. Curti mesmo!
25 de fevereiro de 2009 às 17:49Sucesso.
___________________________________
Visite: www.poesiainconstante.blogspot.com
Prefiro criar poesias, mas ainda assim me atrevo a escrever histórias.
25 de fevereiro de 2009 às 18:03Comecei a escrever uns contos, pra um projeto meu e tenho um roteiro em andamento - não que isso seja o meu forte.
A propósito, tô seguindo teu blog, me segue tbm se quizer.
Té logo!
Achei seu blog nos comentários da Jordana, queria parabeniza-lo seus contos são realmente bons!
25 de fevereiro de 2009 às 19:09O final é impressionante!
26 de fevereiro de 2009 às 03:26É a segunda vez quem venho aqui e a segunda vez que fiquei completamente envolvida na leitura.
Virei tua fã.
Tua criatividade e talento são demais!
Bjus!!
legal, final diferente do que imaginava...
26 de fevereiro de 2009 às 14:19Já conhecia seu blog rsrrsrs
Um beijo!
Bela maneira de escrever! Existem muitos que também escrevem, mas o negócio é colocar um pouco do seu jeito. Parabéns!
26 de fevereiro de 2009 às 14:33Realmente, você usa bem as palavras e a estrutura do conto. Fiquei curioso pelo final. E o final foi curioso...rsss
26 de fevereiro de 2009 às 14:37Teve uma passagem que chamou a atenção:
"Mas quase sempre estes encontros aconteciam assim, sem se esperar. Tudo em cima da hora."
Verdade. E são os melhores.
abs!
Nosss, surpreendente como sempre;
26 de fevereiro de 2009 às 14:39Além do mais tenho que falar que o texto do 'Swing' tb é muito bom!
Eu achei bacana o texto, ele com olhar gordo pela moça..bem envolvente..
Continue assim!
Olá! Obrigada pela visita e pelo comentário lá no Abóboras! Que bom que gostou do curta. Vou procurar esse tal de Bicicletas. O "La maison en petits cubes" me lembrou uns desenhos franceses que assistia quando criança.
26 de fevereiro de 2009 às 14:54Ah, minhas opiniões estão espalhadas pelo blog... Procurando ali, você acha nas entrelinhas. Espero que tenha achado, se não, me avise. ;-)
Ah, já me aventurei nessa área também... Escrevi e dirigi duas propagandas na faculdade. Era aluna do Mauro Giuntinni... Não foi grande coisa, mas me diverti bastante e gostei da experiência. Quem sabe no futuro, eu me arrisque?
E sobre o seu post, adorei a sua crônica. Imaginei mil coisas. Até que ele estava imaginando tudo, apenas tocando a vassoura... E chega aquele final... Não podia ter sido melhor.
Bjos e abóboras!
Que bom que gostou! Segui um pouco seu conselho!
26 de fevereiro de 2009 às 14:57Gostei do blog... legal o texto! Legal mesmo!
26 de fevereiro de 2009 às 15:20Legal o conto!
26 de fevereiro de 2009 às 15:40Bom conto, rico em ambientação
26 de fevereiro de 2009 às 15:52meio rodriguiano, mas mais elegante.
muito bom mesmo.
parabens
Nossa já assiti au filme que ocara era doido... ele adorava trnasar com difuntos .. e essa história me fez lembrar .. credo .. rsrs
26 de fevereiro de 2009 às 16:05Abç..
Eu já li esse post UHAUHA mas voc mudou o banner se não me engano :S sou da comu, e agora to com um novo blog (: reportei o conteudo, só mudei o nome. Ah, adorei seu banner *-* se ele ja estava ai, não tinha reparado mesmo, mas gostei. Beijo, sucesso, boa sorte meeeesmo ! Até. Segue o linkdo novo blog (: .
26 de fevereiro de 2009 às 16:34iiiiirrrruuuuu.
26 de fevereiro de 2009 às 17:04UAEHUheuHAEUhauhAUEHuahuHEUaheuh
depois de um irru não se fala mais nada..
o caboco fez a mina tremer!
AUEHuehuAHEUhaeuHAEUHauehuAHEUaheu
boto fé...
--
www.moolegal.wordpress.com
Gostei do seu, blog, escreve muito bem.
28 de fevereiro de 2009 às 10:33parabens
Carne nova no pedaço.[2]
28 de fevereiro de 2009 às 11:26-----------------------------
http://jokers.mimhospeda.com/
Gente! Que loucura!!! Comecei a ler achando que era uma coisa...no final!!! Putz!!!
8 de março de 2009 às 20:52Cara pesado eim, eu que so tinha lido textos de humor por aqui.Putz vey ne pagando pau nao, mas vc manda muito bem msm.Seu blog é show de bola
10 de março de 2009 às 15:01Postar um comentário